A Perturbação Obsessivo-Compulsiva (POC) constitui uma perturbação de ansiedade específica, a par com a perturbação de pânico, com a fobia social ou com a ansiedade generalizada. É uma das perturbações que, no geral, mais desgasta as pessoas a nível emocional, intelectual e mesmo físico e como tal, limita a qualidade de vida.
As pessoas com experiência de Perturbação Obsessivo-Compulsiva (POC) apresentam maiores défices ao nível da regulação emocional, dado o recurso a mecanismos cognitivos e comportamentais ineficazes, desde a supressão de certos pensamentos ao evitamento de gatilhos, acreditando-se que assim se está a prevenir – quando, efectivamente, se está a circunscrever mais a própria vida.
Casos há em que a POC confina numa perturbação de personalidade (estrutural) – então designada como Perturbação de Personalidade Obsessivo – Compulsiva (PPOC). Quando se diagnostica sob a forma de traço, estímulos desencadeadores (gatilhos) como eventos de vida mais stressantes ou até traumáticos podem influenciar na manifestação e vulnerabilidade desta perturbação. A pessoa com POC receia que os seus pensamentos negativos, sensações ou acções se realizem. E os verbos – chave aqui são “controlar”, “evitar” e “prevenir”. O mal-estar advém das tentativas de afastar os pensamentos, os impulsos, as imagens mentais que afligem constantemente e a pessoa torna-se hiper vigilante sobre o seu corpo, sobre as suas rotinas e sobre tudo o que a rodeia e centra-se em pensamentos recorrentes e intrusivos, por exemplo, sobre doenças, sujidade, contaminação, dúvidas sobre segurança, evitamento de erros, o que considera prejudicial ou perigoso, ferimentos, temor a impulsos ou desejos, actos sexuais pessoalmente repulsivos, imoralidade ou religião, ou em acções de verificação, de organização, de simetria, de exactidão, de rotina ou de compensação. Mas sempre consciente que tais pensamentos incomodam e que até são “irracionais”, o que aumenta ainda mais o desconforto, a depreciação acerca de si mesmo e até a distorção de pensamento que o(a) distanciam ainda mais da realidade. Ou seja, se a POC tem uma base ansiogénica, é com ansiedade que a pessoa também procura resolver o problema.
Mas, como a designação indica, a Perturbação Obsessivo-Compulsiva tem duas componentes: a obsessão e a compulsão. Para considerarmos obsessão teremos então de estar perante pensamentos, impulsos ou imagens mentais com as seguintes características: serem negativos, intrusivos, muitas vezes reconhecidos como absurdos, que surgem repetidamente e que resistem a desaparecer da nossa consciência. Conforme as vivências culturais assim se verifica a prevalência de algumas obsessões. Já a compulsão é o que ritualiza com função de neutralização ou remoção de determinada obsessão e redução ou eliminação da ansiedade, ou do desconforto ou sofrimento associado, ou com intenção de garantir a protecção (daquele tipo de pensamentos, impulsos ou imagens). Ou seja, a compulsão é o comportamento manifesto e repetitivo e é através desta que o sujeito percepciona a função de controlo sobre essa ansiedade e pretende reduzir o sofrimento, mesmo acreditando que possa ser inadequada: contar repetidamente, perguntar frequentemente, evitar côres, números, traços, colocar objectos simetricamente, fazer lavagens constantes, fazer ensaios subvocais de palavras, frases ou orações, fazer verificações repetidas (muitas vezes com regra numérica) para evitar algum resultado temido, fazer colecções várias, ter necessidade de guardar tudo independentemente de vir a ser usado ou não, desenvolver compulsão alimentar… são alguns exemplos. E enquanto as obsessões podem nascer e desenvolver-se em privado, as compulsões, por força da acção comportamental manifestam-se exteriormente ao individuo, logo, constituem a componente visível da perturbação (mesmo aquelas que se possam desenvolver em espaço privado). A maioria dos indivíduos com POC tem tanto obsessões como compulsões.
Tratando-se de uma perturbação de base ansiogénica, a taxa de comorbilidade é (habitualmente) alta. Estatisticamente, mais de metade destas pessoas chegam também ao diagnóstico de depressão major (o que, por sua vez, piora os sintomas obsessivos), ou a fobia social, ou a fobias específicas, ou a perturbação de pânico, ou a perturbação dismórfico corporal, ou a Síndrome de Tourette.
Sem tratamento, a POC não desaparece e, geralmente tende a piorar, não somente pela perturbação em si, mas pelas suas co morbilidades. É comum recorrer-se à farmacologia para solucionar o problema, mas, uma vez mais, somente por esta via estamos a apostar no sintoma desvalorizando a causa e, mais cedo ou mais tarde, voltamos a sentir o incómodo e as limitações do problema. Somente com recurso a esta terapia, no geral e numa situação normal, as doses administradas para a POC são mais elevadas que as administradas na depressão e os efeitos desta medicação pode demorar até 3 meses sendo o desaparecimento dos sintomas gradual. Através de intervenção psicoterapêutica (sobretudo de abordagem cognitivo-comportamental) a prioridade estará em renomear, reatribuir, refocar, reavaliar esquemas / crenças mal adaptativos e em pensamentos metacognitivos que levam a processos automáticos e aí, o objectivo não é que o sujeito neutralize a(s) obsessão(ões) mas que aprenda a distorcer cognições de previsão de cenários mais temidos e a expor-se aos mesmos, a modificar estimativas de ameaça exagerada, a reformular crenças erróneas e de controle, adquirindo estratégias que se vão traduzir no alívio da ansiedade (aprende-se que não é preciso o exercício do ritual para se livrar da ansiedade) e permitindo assim diminuir a angústia da situação. Epidemiologicamente também está demonstrado que a terapia cognitivo-comportamental, designadamente a exposição e prevenção de resposta (ERP) é significativamente mais efectiva que o medicamento sozinho.
Alice Patrício, psicóloga @psicomindcare